A motivação
Acabei de escrever o título desta publicação. Motivação. Falar do que me motiva a perder tempo, dinheiro e sanidade em fazer fotografia em troca de uns corações de uma rede social, ou de um post num blog escondido. Às vezes tenho dificuldade em responder a essa pergunta, tanto quanto racionalizo para ir contra e encerrar este capítulo.
Sinceramente não sei porque gosto de fotografia. Às tantas porque gosto de máquinas fotográficas, ou de ver parado no tempo qualquer coisa que, entretanto, já é passado. Revejo-me em volta de máquinas, especialmente depois da era digital e consequente democratização da imagem. Não guardo essas fotografias. Já as guardei e perdi, sendo bits e bytes que representam absolutamente nada, strings de valores de brilho e produto de algoritmos que ficam perdidos em discos invés de serem recordados em papel. É curioso o valor que damos às fotografias antigas (salvo seja), depositadas nas camadas de papel fotográfico e pouco às representações virtuais em JPG. A ironia é que estamos a formar uma lacuna entre o passado distante e o passado recente, recordações perdidas numa qualquer pasta de um disco ou nuvem com prazo de validade. Talvez por causa da tal democratização da fotografia. Agora é barato, fácil, sem valor. Talvez se valorize pela impressão da fotografia! Talvez volte o hábito de colocar em álbuns, em caixas e abrir anos mais tarde… ou no envelope da FNAC, colocado numa gaveta até ir para o lixo depois do seu tempo de graça.
Não gosto de fotografias bonitas. Gosto de olhar para uma imagem e ver a cena, ou a pessoa, como me recordo. Os gestos e expressões, a realidade de um espaço em mudança, um registo que não se repete. Não se repete. Aí está um outro conceito que se perdeu com a democratização da fotografia. “Ficou mal, repete-se!”, até aparecer numa outra string de bits e bytes uma representação em palco maior de como olhamos para nós próprios. Até compreendo. Não gosto de ser retratado por esse mesmo motivo: não gosto de olhar para mim. Tanta negatividade. Quando pego na máquina, automaticamente todo o meu ser contrai e luta, não é uma sensação agradável. Sei no meu âmago que ninguém vê o que vejo e que imagens vão impressionar a retina, mas não o coração. Gosto de algumas e é isso que vale. Agora que faço este momento de reflexão, apercebo-me que gostam mais das fotografias que não gosto, em tom constrangedor quando as vejo partilhadas entre outras, se sequer.
A resposta é simples e óbvia: sou uma merda naquilo que faço e como o faço, já que primeiro precisamos da confirmação dos outros. Claro que não é assim que funciona, mas funciona assim. De que serve fazer música para ninguém ouvir? Ou outra forma de expressão solitária? Somos seres sociais, é inegável a necessidade de ouvir e ser ouvido, de ver o que os outros veem e sentir que o que vemos é visto. Faço isto para mim, é a resposta à pergunta sobre o que gosto de fazer. Gosto de perder tempo, dinheiro e sanidade, em troco de bits e bytes regurgitados de um algoritmo desmosaico, perdidos num disco. Ou então sou um narcisista em negação, à procura de validação para sentir-me alguém. A segunda hipótese é mais provável.